Palavras do Rabino Pablo Berman

05 de abril de 2024

Parashat Shemini, ou Kosher.

Conta-nos o Midrash que Deus, ao criar o homem, se inspirou tanto nos anjos como nas bestas. Disse Deus olhando os anjos: o homem estará em pé, falará, compreenderá e olhará, como os anjos. E logo, olhando as bestas, disse: o homem comerá, beberá, fará suas necessidades, se procriará e morrerá como as bestas. Somos uma criação única. Temos algo de anjos e também temos algo de bestas. Sabemos que somos somente pó e cinzas frente à imensidade de Deus. Mas, ao mesmo tempo, sabemos que nosso entendimento e percepção nos colocam acima das bestas. 

Um dos pilares do judaísmo através das gerações é, e tem sido, sem dúvida, o conceito Kashrut. De apto ou não apto, apropriado e não apropriado.

A Torá é tão clara, que algumas vezes preferimos não entender para não termos que estar subordinados à ordem divina. Parashat Shemini nos traz a lista de animais puros, ou tehorim, e impuros, ou tmehim. Nada de discussões filosóficas. Se pode ou não se pode. Claramente aparece a lista dos animais que podemos comer e os que não podemos comer. Mamíferos, aves e peixes. O conceito de Cashrut muitas vezes foi limitado a uma questão relacionada à dieta saudável. Nada poderia estar mais longe da verdade. A longa lista de alimentos termina com a expressão 'e vocês serão santos, pois Eu sou santo'. O conceito de Kedusha, sagrado, está ligado à Mitzvá de Cashrut. Em última análise, a mensagem se baseia em compreender que o importante não é apenas que tudo o que entra pela sua boca seja Casher, mas que isso resulte em tudo o que sai da sua boca ser Casher. E isso é, sem dúvida, a tarefa mais difícil.

Tornar-se Kedoshim significa que tudo o que entra em nós, tudo o que comemos, se torna parte de nós, e assim se transforma em parte de nossa essência. Dependerá da essência que consigamos cultivar e alimentar que isso se traduza depois em Mitzvá. Esse resultado será o que SAIR de nós em palavras e ações.

Filão de Alexandria, no primeiro século desta era, retrata através da alegoria esses e outros casos dentro da Torá. A regra para que um animal seja apto é que ele deve ter duas características: ter casco fendido e ser ruminante. Demonstrações exteriores (casco) e interiores (ruminantes). Filão descreve o caso do porco como o de um enganador, um ser que mostra algo que não é na realidade. O porco é o único animal na terra, de acordo com a lista da Torá, que tem casco fendido, mas não é ruminante. É assim que o porco se mostra exteriormente como Casher, escondendo suas verdadeiras características, já que é mais difícil determinar se ele é ruminante ou não.

Tudo o que entra em nós se torna parte de nós, esse é o conceito para ser Kedoshim, não apenas de comer Casher nos fala a Torá, mas de ser Casher. De dia e de noite. E isso, queridos amigos, devemos cultivar por toda a vida. Com essa atitude, com essa essência, conseguiremos purificar nossos corações para servir a Deus com sinceridade. Em busca de um mundo mais transparente, sincero e em paz.

À medida que nos aproximamos do mês de Nissan, os corações do povo judeu se enchem de expectativa e antecipação. Este é um momento de renovação espiritual, um tempo em que nos preparamos para reviver a saga da libertação, a história de um povo que encontrou a liberdade nas mãos de Deus.

Nissan traz consigo um chamado para despertar. É um convite para refletir sobre nossa própria jornada de libertação, para examinar os grilhões que nos prendem e buscar a libertação interior. Cada ação, cada pensamento, representa um ato de preparação, uma expressão de nosso anseio por liberdade. Limpamos o chametz de nossas vidas, não apenas os pedaços de pão de nossas mesas, mas também os resquícios de egoísmo e negatividade de nossas almas.

À medida que nos aproximamos da festa de Pessach, nos lembramos da promessa de redenção, da esperança de um futuro brilhante. Assim como o povo de Israel, atravessaram o Mar Vermelho em direção à liberdade, também nós atravessamos nossos próprios desertos, confiantes de que a mão de Deus está conosco.

Que neste mês de Nissan que vamos iniciar na próxima terça feira, estejamos despertos para as oportunidades de crescimento e transformação. Que possamos entrar em Pessach com corações abertos, prontos para receber a liberdade que Deus nos oferece. Que possamos ser inspirados pela coragem e pela fé dos nossos antepassados, e que possamos encontrar a liberdade verdadeira, não apenas nos rituais de Pessach, mas em cada momento de nossas vidas.

Mas resulta muito difícil falar de Nissan e de Pessach, e de liberdade, quando ainda 134 de nossos irmãos continuam no inferno de |Gaza. Neste mês de Nissan, quando a primavera traz consigo o renascimento da esperança e a celebração da liberdade, nossos corações estão pesados ao lembrar aqueles que fazem seis meses estão naquele inferno e vivenciando o pesadelo mais aterrador de suas vidas. 

Suas famílias aguardam ansiosamente por seu retorno, rezando para que a luz da liberdade brilhe em suas vidas mais uma vez. A dor e a angústia que eles enfrentam são uma ferida aberta em nossa comunidade, um lembrete doloroso de que a luta continua. Que este mês de Nissan nos inspire a unir nossas vozes em solidariedade e ação, para exigir a libertação daqueles que estão sendo mantidos reféns em uma tortura que leva 180 dias, para aqueles que ainda com uma força inacreditável, ainda estejam com vida. 

Que possamos nos comprometer em atos e pensamentos, não apenas a celebrar nossa própria liberdade, mas também a trabalhar incansavelmente pela libertação de todos os reféns, para que possam voltar para casa, para suas famílias e para a vida que lhes foi roubada pelos perversos demônios do terrorismo islâmico do Hamas.